quarta-feira, junho 30, 2010

Ford se deu Mal

    No começo do séc XX o mundo se rendeu ao brilhante Henry Ford e a sua industria automobilística que trazia renovações e modernizações em um ritmo acelerado. Para produzir seus veículos, os funcionários da Ford Motors Company ficavam parados, enquanto as peças do carro iam até eles. Os trabalhadores repetiam os mesmos movimentos o dia inteiro, essa prática foi chamada de “fordismo” e revolucionou os meios de produção.

    Com tanta moral no mundo dos negócios, o americano acabou dando um salto maior que a sua perna. No começo da década de 20 do século passado, metade dos carros que circulavam no mundo eram produzidos por Ford. E todos eles necessitavam de muitas peças de borracha, incluindo os pneus. A borracha, obtida do látex das seringueiras era monopólio inglês. Vinha da Ásia. E Ford, achou que seria melhor não haver essa intermediação. Qual a sua ideia? Produzir borracha no Brasil.

    Essa ideia surgiu depois que teve acesso a um estudo feito pelo governo americano, sobre a possibilidade de obter o látex em solo tupiniquim. Ford acreditou na possibilidade e idealizou a “Fordilândia”, o seu mundo encantado da borracha. Seria na verdade duas cidades construídas as margens do Rio Tapajós no Pará. E que na verdade só trouxeram prejuízos, a começar pela aquisição das terras.

    O cafeicultor Jorge Dumont Villares, já sabendo do interesse do americano por terras na região amazônicas, ganhou do governo do Pará uma imensidão de solo, em sete pontos diferentes. Esperto, Villares foi receber a comitiva de Ford e mostrou os terrenos que tinha próximos ao Tapajós. Eram 1 milhão de hectares. E por eles, Ford pagou ao cafeicultor 125 milhões de dólares. Porém, as terras poderiam ter sido adquiridas gratuitamente, numa negociação direta com o governo do Pará, como fez Villares. Como se não bastasse ter recebido um golpe, logo que chegou no Brasil, as terras compradas eram montanhosas e impróprias para o cultivo das seringueiras.

    A Fordilândia começou a tomar forma em 1928. A floresta foi dando lugar a casas e gente de toda a parte chegava em busca de emprego. Quase metade dos interessados eram reprovados nos exames médicos. Nos 18 anos de vida da Cidade da Borracha, a falta de mão-de-obra foi uma constante. A cidade tinha um dos melhores hospitais do Brasil, e a Vila Americana possuía campo de golfe, cinema, piscina, quadra de tênis. Tudo para divertir os administradores gringos. Os trabalhadores ficavam numa vila mais modesta, porém bem estruturada. Além de receberem seus salários em dinheiro a cada 15 dias. E não era um salário baixo. Era o maior da região. Mesmo assim, os trabalhadores não estavam nada satisfeitos.

    Os cablocos não gostaram de andar nas regras americanas. A cidade era repleta de relógios e uma sirene dividia os turnos, como se não bastasse, bebida alcoólica era terminantemente proibido. A insatisfação fez com que muitos trabalhadores largassem o trabalho. A rigidez encheu o saco da caboclada que em parte foi embora. Podiam não ganhar o mesmo salário em outro lugar, mas pelo menos a cachaça tava liberada. Para quem continuou, a “Ilha dos Inocentes” era o lugar da diversão (tudo escondido é claro). Situada na outra margem do tapajós, lá bebida e mulher eram liberados. Prostitutas vinham das cidades de Santarém e de Belém, e a cachaça vinha boiando pelo rio dentro de melancias ocas.

    Se existe um ditado que os pessimistas adoram é esse: “Não há nada tão ruim que não possa piorar”. E Mister Ford sabe o quão verdadeiras podem ser estas palavras. Em 1930, além de ocorrer uma rebelião, pois os trabalhadores exigiam comer farinha ao invés de espinafre, uma calaminade aconteceu. Um fungo conhecido como mal-das-folhas, que reduz a produção do látex e pode até matar a seringueira, assolou a plantação da Fordlândia.

    Após o fim da Segunda Guerra Mundial (1945), surge a borracha sintética. Com isso, Ford, sem nunca ter pisado no Brasil, decide vender a sua “cidade dos sonhos” e se rende mais tarde a tercerização. O governo brasileiro comprou a Fordlândia por 250 mil dólares. Hoje ela está parecendo uma cidade fantasma, tomada pelo mato e com os objetos usados pelos trabalhadores ainda presentes, como se estivessem esperando por mais um dia de trabalho. Em valores atualizados, os prejuízos de Ford chegaram perto dos 300 milhões de dólares. E cá entre nós: É muito legal quando um desses imperialistas ianques se dá mal.

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