segunda-feira, novembro 19, 2012

A Constituição Liberal de 1824


"A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um.
ARTIGO 179, inciso XIII

Quando ouvi pela primeira vez, uma pessoa afirmar que a Constituição de 1824 era essencialmente liberal, fiquei confuso. Isso porque não entendia como poderia ser isso, uma vez que a mesma fora outorgada e contava com um “tal Poder Moderador”. Essa pequena confusão vinha da falta de entendimento do que era o Liberalismo Clássico, seguido do erro de analisar um documento do século XIX com os conceitos do neoliberalismo.

            Os princípios do Liberalismo Clássico são: defesa das liberdades individuais, igualdade perante a lei, limitação constitucional do governo, direito de propriedade, direitos naturais, proteção das liberdades civis e restrições fiscais ao governo. Pois bem, a Constituição Imperial tinha vários desses elementos, a começar pela divisão de poderes aos moldes da teoria do francês Benjamin Constant. O surgimento do Poder Moderador é atribuído a Martin Francisco de Andrada, que era admirador de Constant. Na prática serviria - como disse Isabel Lustosa [1]- para "resolver impasses e assegurar o funcionamento do governo".

            Outra questão que está em comum acordo com as ideias liberais é a Liberdade religiosa, garantida por Lei, apesar da nação adotar o Catolicismo como sendo sua religião oficial. Embora a liberdade de culto fosse permitida por lei, apenas no âmbito domiciliar, na prática, protestantes e judeus congregavam em seus templos sem sofrerem represália alguma.

            Em seu livro sobre a Monarquia Brasileira, José Murilo de Carvalho[2] afirma que a Constituição Monárquica era tão liberal pra época, que chegava a superar as europeias. E de fato, foi um dos primeiros documentos políticos do mundo a ter um rol de direitos individuais redigido e garantido. Tais como a já citada liberdade religiosa, além da liberdade de expressão e imprensa, inviolabilidade residencial, admissão de qualquer cidadão aos cargos públicos, abolição de castigos físicos como penas criminais e o pleno direito da propriedade privada. Tudo isso está presente no Artigo 179.

            Diante disso, apesar de todos os contrastes, fica óbvio que a primeira, e a mais duradoura, Constituição Brasileira, foi um documento que atendeu vários pontos do Liberalismo Clássico, incluindo um sistema representativo baseado na soberania nacional. Nas palavras de João de Scantimburgo[3]:

“D. Pedro I e os seus constituintes tiveram o bom senso de escolher o melhor regime para a nação tropical, que se emancipava na América, sem copiar os Estados Unidos já consolidados, e as nações hispano-americanas retaliadas por tropelias sem fim, pelo revezamento de breves períodos democráticos e ditaduras caudilhescas”.




[1] LUSTOSA, Isabel. D. Pedro I. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p.175.
[2]  CARVALHO, José Murilo de. A Monarquia brasileira. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1993, p.46.
[3]  SCANTIMBURGO, João de. O Poder Moderador. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura, 1980, p.21.

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